Parque Ary Barroso e suas memórias

Por Taty Maria

Era década de 1990, não lembro muito bem o ano ou a minha idade, mas lembro pelo menos uma vez minha mãe me levou ao Parque Ary Barroso, que fica localizado na Penha, Zona Norte do Rio de Janeiro, para desfrutar de uma tarde de lazer em um parque de área verde perto de casa. Confesso que não lembro com detalhes da situação do parque naquela época, mas me recordo que o espaço já não era o mesmo que minha mãe tinha em suas memórias. Lembro de um ambiente que já não era completamente seguro, apesar das quadras estarem ocupadas por jovens jogando bola, crianças correndo e brincando, andando de patins e bicicleta, e algumas poucas famílias reunidas para piqueniques. Naquele dia era importante não ficar até muito tarde no parque, pois ao anoitecer o mesmo já não apresentava luminosidade o suficiente para nos passar segurança e muito menos havia qualquer agente de segurança no local. Pelos poucos relatos da minha mãe, ela já recorda de um parque com muita área verde, cascatas e lagos superficiais, além das quadras já mencionadas anteriormente. Minha mãe diz que frequentou o parque durante grande parte da sua adolescência, e também que muitos moradores da Baixada Fluminense, pela facilidade de mobilidade urbana para chegar ao local e pela escassez de lugares similares em seus territórios também o frequentavam.

O Parque Ary Barroso é o primeiro parque implantado no subúrbio carioca, considerado um espaço de recreação, criado em 1964, localizado no bairro da Penha Circular, no terreno da antiga Chácara das Palmeiras. As terras pertenciam ao empreendedor português Francisco Lobo Júnior, grande incentivador do desenvolvimento da região. Foi projetado como um bosque, com cascatas e lagos, aproveitando a topografia existente em um terreno originalmente de vegetação esparsa e rarefeita. Além de plantarem 130 espécies distintas de árvores floríferas com épocas alternadas de floração. Em 2003, a Prefeitura do Rio de Janeiro elaborou um projeto de recuperação e revitalização do parque[1].

Tombado provisoriamente pelo Instituto Estadual Do Patrimônio Cultural – INEPAC, sob o registro 08.10.1965 Antiga GB; desde o final da década de 1980, com o aumento da criminalização o parque vem sendo completamente abandonado pelo poder público. Consequentemente a relação dos moradores com o parque mudou, ressignificando o uso do espaço público, ficando apenas nas lembranças a memória do parque de uma época em que eram comuns serem realizados piqueniques, books de casamento, jogos de futebol entre amigos, namoros no banco do parque entre outras atividades quando ainda era considerado um espaço de convivência seguro pelos moradores.

A partir de 2010 com a operação policial nas favelas do Complexo do Alemão e Complexo da Penha, a falta de alternativa de um espaço para instalação da base do exército no bairro, foi liberado a ocupação da base militar no parque, sendo substituída em seguida pela Coordenadoria da UPP. Além dessa estrutura, foram instaladas uma Unidade de Pronto Atendimento e uma Arena Cultural.

Com a intenção de aprofundar a pesquisa já realizada pela Peneira ao longo dos últimos 10 anos sobre memória do cotidiano, relação com o território, uso do espaço público, e oralidade; elementos que potencializam a ressignificação do espaço urbano e possibilitam a construção de outras narrativas, esse projeto de pesquisa que faz parte do Programa de Pós-Graduação de Cultura e Territorialidade da Universidade Federal Fluminense (UFF), tem o objetivo de analisar como as instituições instaladas no Parque Ary Barroso contribuíram para regular as formas de ocupar e ressignificar o espaço público.

Analisarei essas disputas e apropriação do espaço do Parque Ary Barroso, a partir de memórias coletivas e individuais dos moradores e das instituições instaladas no local como recurso para criar participação entre os sujeitos e este espaço. A ideia também é quem sabe transformar essa pesquisa em um produto cultural com o objetivo de atravessar os muros da academia e não deixar apenas no papel o acúmulo gerado por este estudo. Meu desejo é que essa memória não seja esquecida ou apagada, e que através desse estudo também possa contribuir para construção de políticas públicas a fim de revitalizar o primeiro parque de área verde da Zona da Leopoldina.  

[1] Site INEPAC http://www.inepac.rj.gov.br/index.php/bens_tombados/detalhar/343

 

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